Nota: 8,0
O Processo é um livro escrito pelo célebre escritor checo,
Franz Kafka, lançado em 1925, um ano após a morte do autor.
Tido por muitos como um dos maiores romances do século XX, o
enredo apresenta Josef K., um funcionário do alto escalão de um banco, que ao
acordar no dia de seu aniversário de 30 anos se vê detido dentro da pensão onde
mora, com dois vigias a sua guarda, monitorando seus movimentos e o impedindo
de ir trabalhar. A princípio, K. pensa se tratar de uma brincadeira ou uma peça
imposta pelos amigos do banco devido ao seu aniversário. No entanto, ao
perceber a confusão em que se encontra, K. começa a se sentir incomodado e a
exigir explicações sobre o que de fato estava acontecendo. Essa situação de
indefinição e angústia de K. permeia toda a história.
Os dois vigias explicam a K. que também não sabem do que se
trata, só estão cumprindo ordens. E que ele deveria aguardar maiores
informações de um representante. Os vigias forçam K. a vestir sua melhor roupa
ao ir de encontro com tal representante, porém ao indagar o mesmo sobre o
porquê de tudo aquilo, K. é informado que está sendo processado, porém não é
possível dar maiores detalhes sobre seu processo, como informações essenciais
sobre o que ele está sendo acusado. De qualquer forma, K. deveria seguir sua
vida social e profissional normalmente, enquanto respondia ao processo,
comparecendo sempre que lhe fosse solicitado aos tribunais cabíveis.
K. vê a situação toda como um imenso absurdo e procura explicações
dentro da pensão onde mora sobre o surreal fato ocorrido, porém sua inquilina a
Sra. Grubach parece não querer conversar muito com ele, se mostrando por vezes
condolente, por outras impaciente quando importunada por K. Já a outra moradora
de quem K. se aproxima, Sra. Bürstner também se mostra pouco interessada em
ajudar K., no entanto, ela lhe diz que trabalha num escritório de advocacia, o
que muito lhe interessa, já que esta poderia auxiliá-lo no decorrer de seu
misterioso processo. De qualquer forma, K. teve poucas chances de voltar a
conversar com ambas senhoras e lhes deu cada vez menos atenção, muito devido ao
fato das duas se mostrarem pouco solícitas a sua causa.
Durante o primeiro interrogatório, K. após alguma dificuldade
em achar o lugar do tribunal, chegou sem saber também ao certo o horário em que
deveria comparecer. O tribunal ficava numa espécie de cortiço, numa sala de
difícil acesso, onde todos falavam alto, alguns de pé, outros sentados. K. ao
se apresentar, é informado de que está atrasado, e fica revoltado, dando uma
explicação muito revoltada sobre a forma absurda como foi acusado, a maneira
confusa como estava sendo conduzido esse estranho processo e acusou a todos de
quererem lhe extorquir, entre outras afirmações agressivas. A postura de K.
deixa a todos atônitos, porém não tem o efeito que ele esperava, pelo
contrário, ele recebe um sermão pelo comportamento hostil e é retirado do
tribunal.
K. segue sua vida normalmente, até então, sem dar muita
importância ao processo que está respondendo, já que não vê nenhum sentido no
mesmo. Porém, as pessoas aos poucos vão sabendo da situação em que ele se
encontra, o que passa a lhe incomodar profundamente, já que ele ocupa um cargo
de confiança em um grande banco. A informação sobre o processo chega a um tio
de K. chamado Karl, que mora numa cidade distante, e se mostra bastante preocupado com a situação
do sobrinho, muito mais que o próprio acusado. O tio procura convencer K. a dar
maior atenção ao processo, pois este pode ser muito perigoso para o acusado e o
aconselha a procurar um advogado. Ambos então se encaminham a um velho advogado,
Sr. Huld, amigo do tio, que se encontra muito doente, de cama, mas por
consideração ao amigo, topa representar K. no seu processo. No casa do advogado,
K. conhece Leni, uma moça que toma conta do velho, com quem K. acaba tendo um
caso.
Com o passar do tempo, K. passa a ficar cada vez mais
angustiado quanto a definição de seu processo, pois a falta de informações, o
difícil acesso e a morosidade do trabalho do advogado, fazem com que ele não
consiga mais se concentrar na sua antiga rotina tanto social, quanto
profissional. No trabalho, ele é subordinado de um diretor adjunto, com quem
rola uma certa competição, porém cada vez mais debilitado psicologicamente pelo
andamento de seu caso jurídico, cada vez mais abre espaço para o crescimento do
seu superior. Fato que incomoda bastante a K.
Durante o atendimento de um cliente no banco, um industrial
assíduo cliente, K. é surpreendido com o fato do mesmo saber que ele carrega
consigo um processo. Porém, o cliente se mostra disposto a ajudar K., pois
conhece um pintor que é muito próximo ao tribunal e que poderia ajudar K. no
desenrolar do processo. Tal pintor realizava quadros dos próprios magistrados,
juízes, advogados e afins, por isso tinha acesso aos figurões. O industrial
passa o contato do tal pintor para K. que se mostra disposto a procura-lo assim
que fosse possível.
K. vai em busca do pintor em seu atelier, que também se
encontra numa localização esdrúxula, num quarto que foi dado a ele por altos
magistrados. Após alguns melindros de K., o pintor Titorelli começa a dar
algumas informações sobre como funcionam os andamentos dos processos e seus
respectivos tribunais. Após o advogado apresentar a primeira petição – que o
advogado ainda não tinha dado entrada – o processo seria analisado e as
seguintes opções seriam apresentadas: o processo arrastado, que consiste em ir
postergando o processo enfiado em toda sua burocracia, frequentando tribunais,
ocasionalmente pagando propinas, contatando advogados e dispensando quase todo
o tempo hábil ao desenrolar do processo; a absolvição aparente, que consistia
na elaboração de um documento que o Titorelli levaria a um juiz que assinaria o
documento e daria andamento no tribunal, porém a absolvição aparente tinha
efeito temporário, pois quando alguém fosse rever o processo ele voltaria a
tona, tornando necessário que se fizesse todo o procedimento novamente, além
disso, com essa escolha a absolvição real se torna impossível; a outra
possibilidade era a absolvição real, que era o total livramento de culpa e
prosseguimento da vida normal do acusado. K. ficou muito atormentado diante das
escassas possibilidades apresentadas pelo pintor, se vendo cada vez mais
inserido num labirinto burocrático de incertezas e indefinições.
Diante de todo esse drama, K. decide por dispensar os
serviços de seu advogado, que na visão de K. estava demorando muito a dar
entrada na petição junto ao tribunal. Para K., o advogado não estava dando a devida
atenção a seu caso, de forma que ele havia decidido ele próprio redigir a
petição. Chegando à casa do advogado, ao ser recebido por Leni, toma um susto
ao ver que há um homem aparentemente se envolvendo com ela, fato que deixa K.
enciumado, esse homem se chama Rudi Block, um comerciante da região, que também
carrega um processo e é representado pelo mesmo advogado que K. Após uma
aproximação um tanto quanto hostil, eles se aproximam e começam a dialogar
sobre os casos, o comerciante conta que responde o processo a muitos anos e
atualmente, dedica seu tempo quase que exclusivamente a se defender perante os
tribunais, tendo vendido quase todos seus bens, para levantar recursos
financeiros para bancar todos custos processuais. Além disso, o comerciante possuía
além daquele advogado, outros cinco que defendiam sua causa, o que causou
estranheza a K. De qualquer forma, K. mesmo sendo aconselhado pelo comerciante
e por Leni de não dispensar o advogado, ele se mostra decidido e efetua a
dispensa do mesmo, apesar de tentar ser convencido por todos de que estava
cometendo um grande erro.
No final do livro, K. vai a uma catedral encontrar um
cliente, porém este não aparece e K. acaba se encontrando com um sacerdote, que
trabalha para o tribunal e tem conhecimento sobre o processo de K. Ele passa um
sermão em K., por ele não estar se dedicando como deveria ao processo, agindo
de certa forma com prepotência diante da causa. K. já muito cansado ainda tenta
extrair do sacerdote alguns pormenores, mas este, como todos os outros se
mostra hostil e autoritário, num comportamento claramente favorável ao tribunal.
(Atenção Spoiler!)
No último capítulo, no seu aniversário de 31 anos, exatamente
um ano após sua detenção na pensão e início da história, K. recebe dois caras,
que ele descreve primeiro como atores, depois talvez tenores, devido a imensa
papada de ambos. Os dois pegam K. e o levam entrelaçado pelo braço cruzando a
cidade a pé, de modo que K. demonstra pouca resistência perante à situação,
aparentando já saber o que lhe está reservado. Os dois se afastam do centro da
cidade e após alguma hesitação, um dos homem enfia uma faca no peito de K. e dá
duas voltas na mesma. A última fala de K. é: “Como um cão”.
Considerações Finais:
Franz Kafka tratava do absurdo em sua obra como poucos. O
drama de K. parece um pesadelo e ele discorre muitas vezes as situações de uma
maneira totalmente surreal. Com direito a tribunal num cortiço, advogado
atendendo o cliente na cama e outras doideiras características do autor.
Se por um lado, a leitura se mostra difícil em alguns momentos,
com conversações longas, que o autor usa pra decifrar ou complicar a história,
por outro lado, o desejo de decifrar os
mistérios é maior e você se vê emaranhado no meio daquelas palavras, como se
estivesse você próprio sendo processado.
Vale lembrar que O Processo é uma obra inacabada, que apesar
de resgatada, possui diversos trechos riscados e capítulos incompletos que
constam na edição do livro que li. De qualquer forma, ao que parece K. não
queria que fosse desvendado o mistério em volta do processo que assombra K.
As interpretações são diversas, em zilhões de teorias e
diversas linhas de raciocínio, com direito a obras lançadas exclusivamente com
intuito de esmiuçar essa incrível teia de aranha escrita por Kafka. Entre as
muitas teorias, alguns comparam o processo de K., ao modo como alguns
religiosos fanáticos levam sua vida, sempre temendo por um julgamento divino,
que não se sabe ao certo de que forma acontece; outros dizem que o intuito era
mostrar como estamos sendo julgados pela sociedade que nos rodeia sem saber
direito pelo que; outros falam que Kafka queria apenas demonstrar como o
processo burocrático da justiça é falho e complexo, já que ele era formado em
direito; há também quem acredite que K. realmente havia cometido algum crime e
o autor simplesmente não revela qual é.
A possibilidade de tantas interpretações só evidencia o
quanto essa obra é fascinante e justifica que ela tenha se tornado um clássico
da literatura. Pois durante a leitura, é impossível não se envolver e até se
identificar em alguns momentos angustiantes de K., desejando descobrir por que,
afinal, K. está sendo processado. Nunca saberemos, talvez nem Kafka soubesse ao
certo. O fato é que o mistério e as interpretações permanecerão por todos os
tempos.
David Oaski
Kafka já foi um dos meus preferidos, mas continuo a considerá-lo um escritor único, peculiar em sua narrativa, e digno de estudos e teses acadêmicas até hoje.
ResponderExcluirAinda quero ler "Carta ao Pai".
Gosto muito dos teus textos, David!
Abração.
Li somente O Processo Eni, mas concordo plenamente. Kafka inventou um estilo, que é difícil de ser copiado.
ResponderExcluirMuito obrigado pelo comentário e pela visita!!! Volte sempre!!!
Abraço!
Estou lendo o referido livro digitalmente, estou na gênese de seu trabalho, um pouco confuso à princípio, mas com um ótimo enredo, digno de aplausos.
ResponderExcluirLendo O Processo eu me senti como se estivesse num quarto escuro. A sensação é claustrofóbica!
ResponderExcluirÉ realmente essa sensação Brendo. Obrigado pela visita e pelo comentário!
ExcluirAbraço!
Gostei muito da resenha, estou no final deste livro. É bem interessante como a imagem de angústia, de opressão, de se sentir em um túnel é passada. É o primeiro livro de Kafka que eu leio e lerei outros.
ResponderExcluirMuito Bom!!
ResponderExcluirEsse livro o processo, seria o mesmo que " o julgamento " pq toda vez que procuro sobre o julgamento vem ele. E onde acha com essa capa vcs tem ideia ?
ResponderExcluirNome dos personagens trocados?...... O tio gama Leni
ResponderExcluir*chama
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