Um dia morno. Faz calor no meu quarto. Calor mesmo, de o suor
escorrer, com o ventilador fazendo barulho ao fundo. Entediado, zapeando a tv,
com meu velho hábito de ainda passar pela Mtv, na esperança de que eu tenha
entrado sem perceber numa máquina do tempo e acorde em meados dos anos 90, quando
a emissora costumava passar – pasmem – videoclipes, quando ouço uma música
diferente da massa sonora atual, um vocal feminino, cantando versos do tipo: “Não
quero ponta / Eu quero tanto / Te fumar inteiro / Pra ver se chapa”, tudo isso
somado a uma melodia meio psicodélica, meio pop me chamou muita atenção.
Algum tempo depois fui saber que quem tocava aquela canção
era uma banda numerosa, de 12 integrantes, com o nome curioso de Trupe Chá de
Boldo. Ainda bem que fiquei sabendo disso depois de ouvir a música, pois talvez
só pelo nome e naipe dos integrantes o contato com o grupo poderia ter demorado
mais.
Mais que os Titãs: os membros da Trupe |
As informações biográficas da banda ainda são escassas na
Internet, mas sabe-se que o grupo foi fundado em meados de 2005 em São Paulo
por um grupo de estudantes e já tem dois álbuns lançados, o primeiro intitulado
“Bárbaro”, de 2010 e em 2012, o disco que lhes tem trazido algum destaque “Nave
Manha”.
Emergida de uma cena paulista efervescente que conta ainda
com artistas como Tatá Aeroplano e Tulipa Ruiz, o grupo cresceu demais no
segundo disco, deixando de ser um emaranhado confuso de influências para trazer
a tona um disco com canções tão fortes quanto desleixadas, com produção de
Gustavo Ruiz (irmão de Tulipa), e influências claras de samba, bossa,
tropicalismo e da vanguarda paulista, a banda flui seu som diante desse
caldeirão e entrega um dos discos mais interessantes da música nacional
recente.
Em “Nave Manha”, há elementos que não são facilmente
localizados na MPB atual que anda tão careta e quadrada. Há sacanagem,
sagacidade, há melodias espertas, letras com jogos de palavras, lembrando
Arnaldo Antunes, tudo com texturas sonoras agradáveis e extremamente criativas.
A banda ao vivo |
Em alguns momentos, a semelhança com o Grupo Rumo é notável,
assim como é possível notar na obra de Tulipa Ruiz, ao que parece a nova
geração vem finalmente dando o merecido valor que a época não deu aos membros
mais pop da Vanguarda Paulista.
Quando se fala em novas bandas nacionais já espero o clichê.
Ou são bandas de rock adolescentes falando sobre suas emocionantes jornadas
amorosas no shopping center ou temos artistas MPB, que querem soar como um novo
Caetano Veloso, mas a pretensão desses não os deixa ver como estão sendo
ridículos.
Já com a Trupe é possível ver criatividade a cada canção, sendo
que originalidade num tempo de canções de plástico é muito bem vinda. Ao vê-los
tendo algum reconhecimento através da Mtv e mídias da Internet passo a ter
alguma esperança de ver uma nova cena com artistas que por mais que não sejam
brilhantes, fazem o possível para divertir, sem ofender a inteligência de
ninguém.
Dê o play em “Nave Manha” e deixe a boa vibração te levar.
David Oaski
Nenhum comentário:
Postar um comentário