Saber tocar um instrumento é um dom. Dominar um instrumento
então é uma dádiva. Confesso que sinto uma inveja branca dos que carregam
consigo essa capacidade, fico imaginando como deve ser maravilhoso dar vazão às
opiniões, angústias e sentimentos através de uma canção própria, criando sua
letra e melodia, realmente deve ser uma experiência fantástica.
Existem alguns tipos de músicos, aqueles que são virtuosos ao
extremo, como aqueles guitarristas que tocam sessenta milhões de acordes em um
minuto, ou aqueles bateristas em que mal é possível ouvir o intervalo entre as
porradas das baquetas ou aqueles caras que tem agudos capazes de quebrar
vidraças e etc. Há também aqueles músicos mais discretos, introspectivos por
natureza, que prezam pelo minimalismo pra fazer canções que agradem
primeiramente a si próprio e, quem sabe, depois os outros também ouçam. Mas os
tipos de músicos mais especiais são aqueles que conseguem transformar uma
combinação simples entre letra e melodia em hinos inesquecíveis.
Inúmeros músicos habilidosos e com total domínio do seu
instrumento fazem canções elaboradíssimas, com arranjos fenomenais e super
trabalhados e cantam somente para nichos, muitas vezes não alcançando muito
mais que uma carreira amadora.
É tão simples que chega a ser complexo como os Beatles (pra
ficar no exemplo mais óbvio), consegue ultrapassar gerações com suas melodias
singelas, frutos da parceria entre John Lennon e Paul MacCartney. As letras da
banda falam das diversas emoções que passamos no decorrer da vida, além de
alguns devaneios, mas é de entendimento geral que nenhum dos quatro rapazes de
Liverpool eram músicos geniais tecnicamente falando, no entanto eram brilhantes
no que diz respeito ao feeling e talento nato para composições, vide suas
músicas gerarem interesse em qualquer garoto que se aproxime do som da banda ou
a quantidade absurda de discos que o grupo ainda vende, mesmo após décadas
desde o final da banda.
Os exemplos não param por aí. No mainstream da música mundial
atual são poucos os músicos que realmente dominam plenamente seu instrumento, mas
não veja isso como uma coisa ruim, pois muitas das bandas tidas como clássicas
também não eram excepcionais tecnicamente. Por exemplo, quem é o músico
fantástico do Rolling Stones? Keith Ricards é o cara do feeling, da guitarra
com seu timbre único, reconhecível a quilômetros de distância, mas passa longe
do virtuosismo de Jimi Hendrix ou Jimmy Page. Outros exemplos de grandes
músicos que tem canções intrincadas na memória pop mundial para todo sempre são
U2, R.E.M., Oasis, The Clash, Ramones, entre muitos e muitos outros.
Não estou aqui dizendo que não é preciso técnica para se
construir uma carreira sólida, estou dizendo que muitos artistas o fazem
substituindo tais habilidades pelo feeling e talento. Mas claro, vale lembrar
que também existem artistas geniais com seus instrumentos que se tornaram
clássicos, como o Led Zeppelin, o Metallica, o Rush, o Pink Floyd, entre
outros.
A verdade é que não tem muita lógica, às vezes uma música
bate e já era, ela se torna especial pra você e não há mais como reverter esse
processo. Mas é fato que existem bandas que conseguem despertar essa sensação
em mais pessoas.
Transmita as músicas dos ouvidos para o coração e não para a
cabeça e a experiência será muito mais completa, pode ter certeza. Nunca,
jamais sinta algum incomodo por gostar de determinada banda ou som, pois isso
simplesmente não se explica, se sente.
David Oaski
Música transcende. Seja pela técnica ou pelo feeling que transmite. Talvez a regra mais importante seja: nunca se render à técnica em desfavor da arte. Pois música é arte. E arte não se qualifica matematicamente, se entende. E na maioria das vezes, mesmo sem se entender, se sente.
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