Chame de memória afetiva, de saudosismo, de apego ao passado
ou até mesmo ranzinza, mas se compararmos o mundo atual ao de 15, 20 anos
atrás, veremos que tudo era mais legal.
Não sou nenhum ancião, nasci em 1988, tendo vivido a adolescência
do final dos anos 90 ao começo dos anos 2000, mas lembro o suficiente e leio o
suficiente sobre a época para saber que tudo está mais chato, entediante e efêmero.
Até a disseminação dos computadores e da Internet no começo
dos anos 2000, o comportamento humano era totalmente diferente e a história
ainda não teve distanciamento suficiente para notarmos o quão drásticas são as
mudanças. Basta analisarmos como as pessoas ouviam músicas, compartilhavam
informações, assistiam filmes e, principalmente, interagiam entre si que
veremos o quanto são substanciais as alterações nos comportamentos dos indivíduos
nessa nova sociedade em que vivemos.
Até duas décadas atrás o único jeito de ouvir um disco de um
artista que você admirasse era comprando o LP ou K7, ou ainda tentando caçar um
ou outro som na rádio e gravá-lo. Além disso, as pessoas paravam para ouvir
música, esse era o programa principal, chegando a reunir galeras em torno de
uma audição. Hoje em dia, ouvir um disco é uma atitude totalmente banal,
executada enquanto se está em redes sociais ou na academia ou no serviço, mas
nunca realmente prestando atenção na arte que invade seus ouvidos. Toda essa
trivialidade faz com que cada vez mais artistas de qualidade duvidosa ganhem
status de astros, sem contar o fato de que a qualidade dos arquivos comprimidos
em MP3 é pra lá de questionável, tendo na maioria das vezes perca notável na
qualidade da reprodução da música.
Diante da facilidade de enviar um e-mail, seja pelo
computador ou pelo celular, muitos se esquecem de que a única forma de se
comunicar com parentes distantes era através de caras ligações interurbanas ou
cartas. O hábito de escrever cartas era dos mais prazerosos que existiam e a
ansiedade de aguardar a resposta também valia a pena. Tudo isso longe da frieza
proporcionada pelos correios eletrônicos.
Outro exemplo claro é a forma como as pessoas assistem filmes
hoje em dia, mal e porcamente através de downloads de péssima qualidade, por
streaming online travando a cada dois segundos e comprando de baciada de
ambulantes em que os DVDs mal leem os discos. Até algum tempo atrás para ver um
bom filme, as pessoas alimentavam o habito de ir ao cinema (que ainda existe, é
claro) ou iam às locadoras, rodear os corredores, ler as capinhas, entrar na
sessão de pornô. Toda essa porcaria pirata e a acomodação dos seus donos acabou
com o mercado de locadoras.
Tudo isso é motivo de saudade, mas o principal
definitivamente é a forma como as pessoas interagem hoje em dia. Cada vez mais
distantes e frias, priorizando o contato via Internet ao cara a cara, com
preocupação em tirar fotos o tempo todo para mostrar aos amigos algo que nem
está sentindo tanto prazer em fazer, por pura osmose. Nas gerações passadas, os
casais (quando saudáveis) chegavam em casa à noite e conversavam sobre seus
dias, os adolescentes formavam rodinhas em condomínios e na rua, além de
brincar o dia todo nesses mesmos locais. As pessoas compartilhavam histórias
olhando nos olhos um do outro, isso não tem Internet que pague.
É claro que não sou louco nem cego de não reconhecer os
benefícios da Internet, que diminuiu fronteiras, integrou o mundo e facilitou
infinitamente o acesso à informação, porém mesmo com toda essa facilidade as
pessoas cada vez mais adotam um comportamento alienado, com pouco ou nenhum
sistema de filtragem de informação, de gostos e atitudes.
O avanço mais considerável que o Brasil teve nos anos
recentes foi no âmbito econômico, de forma que o cidadão médio e até de baixa
renda tem maior poderio econômico, mas isso também trouxe uma onda de
consumismo e endividamento, além do que não trouxe consigo avanços em outras
áreas de suma importância do país, como saúde, segurança e educação.
O fato é que vemos cada vez menos artistas criativos, pois os
poucos que existem sobrevivem em pequenos nichos, e cada vez mais gente se
sentindo sufocada e angustiada num mundo cada vez mais esmagado pela tecnologia
que oprime qualquer um que saia da linha de mediocridade que o sistema impõe
como certo.
As relações humanas ficaram pra trás, estamos todos virando robôs.
David Oaski
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